3.1 Raquel Macedo, infância

Vim ao mundo “nada planejado ou desejado” pelos meus pais. Eles eram pessoas modestas, dignas, lutadoras, que já tinham um filho pequeno e viviam com muita dificuldade financeira. Meu pai funcionário público e minha mãe uma simples e competente dona de casa.

Estudei em colégio do estado, usei sapato furado, roupa doada e reformada, não tinha lanche para levar para a escola, mal tive cadernos em minha infância. Fabricava sozinha e até com bastante criatividade meus cadernos com o “avesso dos papéis impressos que eram descartados” pelo DER, onde meu pai trabalhava. Os tenho até hoje, bem guardados e organizados em minhas orgulhosas recordações! Vivi e conheci simplicidade, pobreza, sofrimento… Mesmo assim, ainda fui uma criança linda de alma, cheia de vida, capricho, invenções até para criar meus brinquedos, que fazia com minhas mãos ainda tão pequenas. Tornei-me ainda na infância, “artesã”, sendo que ainda amo esta arte e a faço em minhas horas de folga.

Talvez por eu ter absorvido a “rejeição” ainda no útero de minha mãe, que desde este tenro tempo, meu temperamento sempre foi de muita luta e consequentes vitórias. Como uma criança com pouca infância, sempre muito madura e responsável, concluí cedo, que “eu mesma é que teria que fazer algo para melhorar minha vida” sem nunca culpar outros ou esperar que alguém fizesse algo maior, ou melhor, por mim.

Tive louváveis avós, materna e paterna, foram mulheres maravilhosas que as assisti lutarem por sobrevivência, ambas abandonadas pelos homens que com elas fizeram seus filhos. “Maria Albertina Camargo de Paula” (fazia panos de prato de sacos de farinha para vender, com admirável perfeccionismo e capricho) e “Mathilde Bugni, apelido: Pina”. (Fazia casacos maravilhosos de tricô, dia e noite dando conta das encomendas).

Fui criada por uma tia, irmã de meu pai, que morava conosco. Foi para mim uma “segunda mãe e uma grande amiga”! Era secretária executiva da tão famosa IBM, sempre foi muito inteligente, prodígio nas tais programações, se destacando e superando até os engenheiros tão eficazes da época! Mais madura, trabalhou na Bates do Brasil e depois, se forma advogada, trabalhando de dia e estudando a noite em Bragança Paulista. Vivia exausta de cansaço. Inesquecível para mim, ainda menina, estar ao lado dela em seu “exame oral na OAB de São Paulo”. Ela tirou “nota dez com louvor, foi aplaudida de pé pela banca examinadora”! Que orgulho e que exemplo eterno tive desta tia tão amada e querida, de nome: Thilda Eugenio, apelido: tia Cuda.

Estas grandes três mulheres, “meus ícones, meus reais exemplos de vida”! Sempre viveram com muito trabalho, poucas horas de descanso, muito esforço, esmero e garra. Venceram e sobreviveram por elas próprias, “sozinhas”, sem contar com parceiros homens para lhes prover nada. A elas rendo minhas homenagens e meu eterno orgulho de tê-las tido ao meu lado por longos anos de minha vida, me inspirando a buscar incansavelmente meus sonhos mesmo que fosse tirando meu sangue!

Fiz e continuo fazendo sempre o melhor que posso por qualquer ser humano, pela família, vizinhos, amigos e cachorros. Sempre tive este instinto de me doar em trabalhos, auxílios, arrumações.

 

Paulo Sérgio – Apenas uma palavra / Autor: Nenéo  (LP-10) 1976 – Beverly